Receita Federal do Brasil regulamenta o Regime Tributário de Transição instituído pela Lei nº 11.941/2009

Em 17/09/2013, foi publicada a Instrução Normativa nº 1.397 (“IN”), de 16/09/2013, editada pela Receita Federal do Brasil (“RFB”). Trata-se de norma infralegal que regulamenta, de forma consolidada, os ajustes decorrentes do Regime Tributário de Transição (“RTT”), instituído pela Lei nº 11.941/2009.

O RTT foi criado pela Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009. Tal norma, entre as diversas alterações efetuadas na legislação fiscal brasileira, objetivou neutralizar os impactos tributários da adoção dos novos critérios contábeis instituídos pela Lei nº 11.638/2007, até a integração definitiva da legislação tributária com os novos métodos e critérios internacionais de contabilidade (IFRS). O regime foi opcional para os anos-calendário de 2008 e 2009, e, a partir do ano-calendário de 2010, tornou-se obrigatório para as empresas sujeitas ao lucro real, lucro presumido e lucro arbitrado, no que se refere à apuração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.

Conforme o art. 15, § 1º, da Lei nº 11.941/209, o regime vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária. Referida norma ainda não foi editada, o que faz com que o RTT, e agora também a IN RFB nº 1.397/2013, continuem obrigatórios por período indeterminado.

I. Escrituração Contábil Fiscal

Pois bem, a nova instrução normativa prevê que, a partir do ano-calendário de 2014, as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real deverão transmitir a “Escrituração Contábil Fiscal – ECF” anualmente por meio do “Sistema Público de Escrituração Digital – SPED”, utilizando os métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007, ou seja, segundo o regime jurídico anterior ao advento da Lei nº 11.638/2007.

O arquivo contendo as informações da ECF deverá ser enviado até o último dia útil do mês de junho do ano seguinte ao ano-calendário a que se refira a escrituração, exceto os casos de cisão, cisão parcial, fusão, incorporação ou extinção, cuja ECF deverá ser transmitida até o último dia útil do mês subsequente ao do evento.

Importante mencionar que o envio das informações necessárias para gerar o “Controle Fiscal Contábil de Transição – FCONT” continua obrigatório até o ano-calendário de 2013, de acordo com a Instrução Normativa RFB nº 967/2009.

Ou seja, a RFB decidiu obrigar as empresas a manter duas contabilidades separadas: uma para os acionistas e outros interessados, conforme normas do IFRS, e outra para fins tributários, pelo modelo contábil vigente até 31/12/2007.

Ressalta-se que a ECF prevista pela IN nada mais é que uma demonstração financeira completa, devendo conter balanço patrimonial, conta de resultados e informações referentes à mutação do patrimônio líquido, o que certamente gerará mais custos ao empresário.

II. Conceito de Lucro Real e Ajustes do Lucro Líquido

A IN, em seus arts. 7º ao 9º, reitera o conceito de lucro real e a definição dos ajustes ao lucro líquido para sua apuração (adições, exclusões e compensações), os quais já são previstos na legislação tributária (art. 6º do Decreto-lei nº 1.598/1977). Entretanto, tais elementos, em virtude do RTT, deverão evidentemente ser apurados observando os métodos e critérios contábeis vigentes até 31/12/2007.

III. Demonstrações Financeiras

O art. 10 da IN prevê que, ao fim de cada período de apuração, deverão ser transcritos no “Livro de Apuração do Lucro Real” (“LALUR”) o balanço patrimonial, a demonstração do resultado do período de apuração e a demonstração de lucros ou prejuízos acumulados, devendo o contribuinte observar, em coerência com os dispositivos normativos anteriores, os métodos e critérios contábeis aplicáveis anteriormente às alterações promovidas pelas Leis nº 11.638/2007 e 11.941/2009.

IV. Tratamento Tributário

A IN estabeleceu o tratamento tributário para algumas operações em razão do RTT. As principais regras são as seguintes:

· Prêmio na emissão de debêntures: a IN estabeleceu as condições para que o valor do prêmio de debêntures não seja computado no lucro real (art. 11);

· Subvenções para investimento e doações: a IN determinou as condições para que tais valores não sejam computados no lucro real (arts. 12 e 13);

· Investimentos avaliados pelo valor de patrimônio líquido: foi determinado pela IN que a avaliação dos investimentos em sociedades controladas e coligadas deve seguir os métodos e critérios contábeis vigentes anteriores à Lei nº 11.638/2007 (arts. 15 a 17);

· Escrituração do LALUR: foram estabelecidos os detalhes quanto aos valores a ser discriminados na demonstração do lucro real até o ano-calendário de 2013 (art. 18) e a partir do ano-calendário de 2014 (art. 19);

· Lucro líquido para fins societários: a IN dispôs sobre quais métodos e critérios podem ser adotados para determinação do lucro líquido para fins societários (basicamente, são aqueles introduzidos pela Lei nº 11.638/2007 e pela Lei nº 11.941/2009 e pelos órgãos reguladores brasileiros, como a Comissão de Valores Mobiliários – CVM) (art. 20).

V. Temas polêmicos

A IN também tratou sobre temas polêmicos, os quais ainda são debatidos pela doutrina brasileira e pelos tribunais fiscais e judiciais, tais como:

a) Juros sobre o Capital próprio (“JCP”)

Consoante o art. 14, caput, da IN, a pessoa jurídica poderá deduzir, para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, os juros pagos ou creditados de modo individualizado a titular, sócio ou acionista, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP (taxa de juros que é referência para correção de empréstimos tomados junto ao BNDES).

Segundo a nova norma, contudo, para o cálculo da parcela a deduzir, deverá ser considerado o valor do patrimônio líquido de acordo com os métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007 (art. 14, parágrafo único, da IN). A IN determina assim que deve ser considerado para o cálculo dos JCP o patrimônio líquido fiscal.

Nesse contexto, ressalta-se que a Lei nº 11.941/2009, em seu o art. 16, estabelece a neutralidade tributária irrestrita no âmbito do RTT, nesses termos:

“As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.”

Não há na Lei nº 9.249/1995 (lei que instituiu a dedução dos JCP) dispositivo que determine que a base de cálculo dos JCP seja o “patrimônio líquido fiscal”, e, em assim determinando a IN, fica claro que há ofensa ao conteúdo do art. 16 da Lei nº 11.941/2009, pois há rompimento com a neutralidade fiscal irrestrita trazida pela Lei.

Como aduz o art. 16 acima, o novo padrão contábil apenas deve ser utilizado nos casos em que os critérios de reconhecimento de custo, despesa ou receita tenham sido alterados, com o respectivo efeito sobre a apuração do lucro líquido. Considerando que os JCP não partem diretamente destas hipóteses, não cabe à Receita Federal do Brasil estabelecer, por meio de norma infralegal, que o patrimônio líquido a ser considerado para o cálculo do valor dedutível seja aquele levantado de acordo com as regras contábeis vigentes em 31/12/2007, o que fere também o Código Tributário Nacional.

Interessante notar que a RFB age contrariamente ao princípio da igualdade tributária quanto à dedução do ágio na base de cálculo do IRPJ e CSLL, gerado a partir de aquisições societárias. O órgão fiscal tem defendido que tal valor deve ser apurado em conformidade com as novas regras contábeis vigentes, sendo que agora não é mais possível calcular o ágio apenas com base na diferença entre o valor pago e o valor contábil da participação societária.

O ágio segundo as novas normas contábeis é aquele calculado conforme expectativa de rentabilidade futura (goodwill), sendo esse o valor residual pago em uma aquisição. Desse modo, pelas novas regras o montante do ágio é diminuto em comparação com as normas antigas, o que diminui, portanto, também o benefício fiscal para aquele que adquire a participação societária.

b) Lucros e dividendos

O caput do art. 26 da IN estabelece que os lucros ou dividendos pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real não integrarão as bases de cálculo do imposto de renda e da CSLL da pessoa beneficiária.

Por outro lado, e reproduzindo o mesmo entendimento que foi determinado para os JCP, o parágrafo único deste dispositivo prescreve que a não incidência do imposto de renda aplica-se apenas aos lucros ou dividendos obtidos com observância dos métodos e critérios contábeis vigentes até 31/12/2007.

Outrossim, o art. 27 da IN mantém as regras para as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido ou arbitrado, exceto pelo fato de que também restringe a utilização dos critérios contábeis vigentes até 31/12/2007 para os valores que excederem ao lucro presumido. Desse modo, referida norma dispõe que poderá ser distribuído, a título de lucros, sem incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte:

· o valor da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita a pessoa jurídica; e

· a parcela dos lucros ou dividendos excedente ao valor determinado acima, desde que a empresa demonstre, por meio de ECF, que o lucro obtido com observância dos métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007 é maior que o determinado segundo as normas para apuração da base de cálculo do imposto pela qual houver optado, ou seja, o lucro presumido ou arbitrado.

E o art. 28 prescreve, por sua vez, que, sobre a parcela excedente de lucros distribuídos:

· Haverá a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado de acordo com a Tabela Progressiva Mensal e integrar a base de cálculo do Imposto sobre a Renda na Declaração de Ajuste Anual do ano-calendário do recebimento, no caso de beneficiário pessoa física residente no País;

· Será computada na base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL, para as pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil;

· Sofrerá a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado à alíquota de 15%, no caso de beneficiário residente ou domiciliado no exterior; e

· Sujeitar-se-á à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado a alíquota de 25%, no caso de beneficiário residente ou domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida.

Em realidade, esses dispositivos da IN repete o conteúdo do Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) nº 202, publicado em fevereiro de 2013. Neste parecer, a PGFN, analisando o regime jurídico dos pagamentos de dividendos, expressa seu entendimento de que “para fins de distribuição de lucros e dividendos, pelas pessoas jurídicas sujeitas ao Regime Tributário de Transição (RTT), de que trata o art. 15 da Lei nº 11.941, de 2009, são considerados isentos os lucros ou dividendos distribuídos até o montante do lucro fiscal apurado no período, ou seja, do lucro líquido apurado conforme os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007”.

Segundo o raciocínio do parecer, a isenção tributária no pagamento de lucros e dividendos, a qual é prevista no art. 10 da Lei nº 9.249/1995, somente se aplica sobre os lucros apurados a partir dos critérios contábeis brasileiros em vigor em 31/12/2007.

Como se vê, a IN aplica o mesmo entendimento prescrito aos JCP, incorrendo na mesma violação ao art. 16 da Lei 11.941/2009. Além disso, a norma de isenção citada não traz qualquer critério especial, motivo pelo qual é certo o direito de escolha do método para apuração desse montante pelo contribuinte sem que haja tributação desses valores.

Por fim, é preciso esclarecer quanto à insegurança jurídica patente trazida pela IN, pois a RFB não deixa claro se as novas normas regulamentares aplicam-se retroativamente (de 2008 a 2013) ou vigerão somente a partir de 2014. Notícias na mídia, no entanto, dão conta de que serão utilizadas retroativamente, com grandes riscos de autuação àqueles que não as seguirem.

David Roberto R. Soares da Silva e Danilo José D’Ambros Junior, Battella, Lasmar & Silva AdvogadosEm 17/09/2013, foi publicada a Instrução Normativa nº 1.397 (“IN”), de 16/09/2013, editada pela Receita Federal do Brasil (“RFB”). Trata-se de norma infralegal que regulamenta, de forma consolidada, os ajustes decorrentes do Regime Tributário de Transição (“RTT”), instituído pela Lei nº 11.941/2009.

O RTT foi criado pela Medida Provisória nº 449/2008, posteriormente convertida na Lei nº 11.941/2009. Tal norma, entre as diversas alterações efetuadas na legislação fiscal brasileira, objetivou neutralizar os impactos tributários da adoção dos novos critérios contábeis instituídos pela Lei nº 11.638/2007, até a integração definitiva da legislação tributária com os novos métodos e critérios internacionais de contabilidade (IFRS). O regime foi opcional para os anos-calendário de 2008 e 2009, e, a partir do ano-calendário de 2010, tornou-se obrigatório para as empresas sujeitas ao lucro real, lucro presumido e lucro arbitrado, no que se refere à apuração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS.

Conforme o art. 15, § 1º, da Lei nº 11.941/209, o regime vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária. Referida norma ainda não foi editada, o que faz com que o RTT, e agora também a IN RFB nº 1.397/2013, continuem obrigatórios por período indeterminado.

I. Escrituração Contábil Fiscal

Pois bem, a nova instrução normativa prevê que, a partir do ano-calendário de 2014, as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real deverão transmitir a “Escrituração Contábil Fiscal – ECF” anualmente por meio do “Sistema Público de Escrituração Digital – SPED”, utilizando os métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007, ou seja, segundo o regime jurídico anterior ao advento da Lei nº 11.638/2007.

O arquivo contendo as informações da ECF deverá ser enviado até o último dia útil do mês de junho do ano seguinte ao ano-calendário a que se refira a escrituração, exceto os casos de cisão, cisão parcial, fusão, incorporação ou extinção, cuja ECF deverá ser transmitida até o último dia útil do mês subsequente ao do evento.

Importante mencionar que o envio das informações necessárias para gerar o “Controle Fiscal Contábil de Transição – FCONT” continua obrigatório até o ano-calendário de 2013, de acordo com a Instrução Normativa RFB nº 967/2009.

Ou seja, a RFB decidiu obrigar as empresas a manter duas contabilidades separadas: uma para os acionistas e outros interessados, conforme normas do IFRS, e outra para fins tributários, pelo modelo contábil vigente até 31/12/2007.

Ressalta-se que a ECF prevista pela IN nada mais é que uma demonstração financeira completa, devendo conter balanço patrimonial, conta de resultados e informações referentes à mutação do patrimônio líquido, o que certamente gerará mais custos ao empresário.

II. Conceito de Lucro Real e Ajustes do Lucro Líquido

A IN, em seus arts. 7º ao 9º, reitera o conceito de lucro real e a definição dos ajustes ao lucro líquido para sua apuração (adições, exclusões e compensações), os quais já são previstos na legislação tributária (art. 6º do Decreto-lei nº 1.598/1977). Entretanto, tais elementos, em virtude do RTT, deverão evidentemente ser apurados observando os métodos e critérios contábeis vigentes até 31/12/2007.

III. Demonstrações Financeiras

O art. 10 da IN prevê que, ao fim de cada período de apuração, deverão ser transcritos no “Livro de Apuração do Lucro Real” (“LALUR”) o balanço patrimonial, a demonstração do resultado do período de apuração e a demonstração de lucros ou prejuízos acumulados, devendo o contribuinte observar, em coerência com os dispositivos normativos anteriores, os métodos e critérios contábeis aplicáveis anteriormente às alterações promovidas pelas Leis nº 11.638/2007 e 11.941/2009.

IV. Tratamento Tributário

A IN estabeleceu o tratamento tributário para algumas operações em razão do RTT. As principais regras são as seguintes:

· Prêmio na emissão de debêntures: a IN estabeleceu as condições para que o valor do prêmio de debêntures não seja computado no lucro real (art. 11);

· Subvenções para investimento e doações: a IN determinou as condições para que tais valores não sejam computados no lucro real (arts. 12 e 13);

· Investimentos avaliados pelo valor de patrimônio líquido: foi determinado pela IN que a avaliação dos investimentos em sociedades controladas e coligadas deve seguir os métodos e critérios contábeis vigentes anteriores à Lei nº 11.638/2007 (arts. 15 a 17);

· Escrituração do LALUR: foram estabelecidos os detalhes quanto aos valores a ser discriminados na demonstração do lucro real até o ano-calendário de 2013 (art. 18) e a partir do ano-calendário de 2014 (art. 19);

· Lucro líquido para fins societários: a IN dispôs sobre quais métodos e critérios podem ser adotados para determinação do lucro líquido para fins societários (basicamente, são aqueles introduzidos pela Lei nº 11.638/2007 e pela Lei nº 11.941/2009 e pelos órgãos reguladores brasileiros, como a Comissão de Valores Mobiliários – CVM) (art. 20).

V. Temas polêmicos

A IN também tratou sobre temas polêmicos, os quais ainda são debatidos pela doutrina brasileira e pelos tribunais fiscais e judiciais, tais como:

a) Juros sobre o Capital próprio (“JCP”)

Consoante o art. 14, caput, da IN, a pessoa jurídica poderá deduzir, para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, os juros pagos ou creditados de modo individualizado a titular, sócio ou acionista, a título de remuneração do capital próprio, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à variação da Taxa de Juros de Longo Prazo – TJLP (taxa de juros que é referência para correção de empréstimos tomados junto ao BNDES).

Segundo a nova norma, contudo, para o cálculo da parcela a deduzir, deverá ser considerado o valor do patrimônio líquido de acordo com os métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007 (art. 14, parágrafo único, da IN). A IN determina assim que deve ser considerado para o cálculo dos JCP o patrimônio líquido fiscal.

Nesse contexto, ressalta-se que a Lei nº 11.941/2009, em seu o art. 16, estabelece a neutralidade tributária irrestrita no âmbito do RTT, nesses termos:

“As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.”

Não há na Lei nº 9.249/1995 (lei que instituiu a dedução dos JCP) dispositivo que determine que a base de cálculo dos JCP seja o “patrimônio líquido fiscal”, e, em assim determinando a IN, fica claro que há ofensa ao conteúdo do art. 16 da Lei nº 11.941/2009, pois há rompimento com a neutralidade fiscal irrestrita trazida pela Lei.

Como aduz o art. 16 acima, o novo padrão contábil apenas deve ser utilizado nos casos em que os critérios de reconhecimento de custo, despesa ou receita tenham sido alterados, com o respectivo efeito sobre a apuração do lucro líquido. Considerando que os JCP não partem diretamente destas hipóteses, não cabe à Receita Federal do Brasil estabelecer, por meio de norma infralegal, que o patrimônio líquido a ser considerado para o cálculo do valor dedutível seja aquele levantado de acordo com as regras contábeis vigentes em 31/12/2007, o que fere também o Código Tributário Nacional.

Interessante notar que a RFB age contrariamente ao princípio da igualdade tributária quanto à dedução do ágio na base de cálculo do IRPJ e CSLL, gerado a partir de aquisições societárias. O órgão fiscal tem defendido que tal valor deve ser apurado em conformidade com as novas regras contábeis vigentes, sendo que agora não é mais possível calcular o ágio apenas com base na diferença entre o valor pago e o valor contábil da participação societária.

O ágio segundo as novas normas contábeis é aquele calculado conforme expectativa de rentabilidade futura (goodwill), sendo esse o valor residual pago em uma aquisição. Desse modo, pelas novas regras o montante do ágio é diminuto em comparação com as normas antigas, o que diminui, portanto, também o benefício fiscal para aquele que adquire a participação societária.

b) Lucros e dividendos

O caput do art. 26 da IN estabelece que os lucros ou dividendos pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real não integrarão as bases de cálculo do imposto de renda e da CSLL da pessoa beneficiária.

Por outro lado, e reproduzindo o mesmo entendimento que foi determinado para os JCP, o parágrafo único deste dispositivo prescreve que a não incidência do imposto de renda aplica-se apenas aos lucros ou dividendos obtidos com observância dos métodos e critérios contábeis vigentes até 31/12/2007.

Outrossim, o art. 27 da IN mantém as regras para as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido ou arbitrado, exceto pelo fato de que também restringe a utilização dos critérios contábeis vigentes até 31/12/2007 para os valores que excederem ao lucro presumido. Desse modo, referida norma dispõe que poderá ser distribuído, a título de lucros, sem incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte:

· o valor da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita a pessoa jurídica; e

· a parcela dos lucros ou dividendos excedente ao valor determinado acima, desde que a empresa demonstre, por meio de ECF, que o lucro obtido com observância dos métodos e critérios contábeis vigentes em 31/12/2007 é maior que o determinado segundo as normas para apuração da base de cálculo do imposto pela qual houver optado, ou seja, o lucro presumido ou arbitrado.

E o art. 28 prescreve, por sua vez, que, sobre a parcela excedente de lucros distribuídos:

· Haverá a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado de acordo com a Tabela Progressiva Mensal e integrar a base de cálculo do Imposto sobre a Renda na Declaração de Ajuste Anual do ano-calendário do recebimento, no caso de beneficiário pessoa física residente no País;

· Será computada na base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL, para as pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil;

· Sofrerá a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado à alíquota de 15%, no caso de beneficiário residente ou domiciliado no exterior; e

· Sujeitar-se-á à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte calculado a alíquota de 25%, no caso de beneficiário residente ou domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida.

Em realidade, esses dispositivos da IN repete o conteúdo do Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) nº 202, publicado em fevereiro de 2013. Neste parecer, a PGFN, analisando o regime jurídico dos pagamentos de dividendos, expressa seu entendimento de que “para fins de distribuição de lucros e dividendos, pelas pessoas jurídicas sujeitas ao Regime Tributário de Transição (RTT), de que trata o art. 15 da Lei nº 11.941, de 2009, são considerados isentos os lucros ou dividendos distribuídos até o montante do lucro fiscal apurado no período, ou seja, do lucro líquido apurado conforme os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007”.

Segundo o raciocínio do parecer, a isenção tributária no pagamento de lucros e dividendos, a qual é prevista no art. 10 da Lei nº 9.249/1995, somente se aplica sobre os lucros apurados a partir dos critérios contábeis brasileiros em vigor em 31/12/2007.

Como se vê, a IN aplica o mesmo entendimento prescrito aos JCP, incorrendo na mesma violação ao art. 16 da Lei 11.941/2009. Além disso, a norma de isenção citada não traz qualquer critério especial, motivo pelo qual é certo o direito de escolha do método para apuração desse montante pelo contribuinte sem que haja tributação desses valores.

Por fim, é preciso esclarecer quanto à insegurança jurídica patente trazida pela IN, pois a RFB não deixa claro se as novas normas regulamentares aplicam-se retroativamente (de 2008 a 2013) ou vigerão somente a partir de 2014. Notícias na mídia, no entanto, dão conta de que serão utilizadas retroativamente, com grandes riscos de autuação àqueles que não as seguirem.

David Roberto R. Soares da Silva e Danilo José D’Ambros Junior, Battella, Lasmar & Silva Advogados

Compartilhar: